Segue uma análise bíblico-teológica e exegética de Mateus 24.24, elaborada com base direta nos PDFs utilizados ao longo da conversa — Desconstruindo o Calvinismo (Hutson Smelley), Contra o Calvinismo (Roger Olson), Que Amor é Este? (Dave Hunt), O Outro Lado do Calvinismo (Laurence M. Vance) e Manual Popular de Dúvidas, Enigmas e “Contradições” da Bíblia (Norman Geisler & Thomas Howe) — respondendo à pergunta:
“Porque surgirão falsos cristos e falsos profetas, e farão tão grandes sinais e prodígios, que, se possível fora, enganariam até os escolhidos.”
(Mt 24.24)
1. O contexto da advertência de Jesus
Mateus 24 é um discurso de advertência, não de garantia automática. Jesus descreve:
- perseguição,
- apostasia,
- engano religioso,
- falsos sinais,
- e necessidade de vigilância.
Hutson Smelley observa que todo o discurso escatológico de Jesus é construído sobre alertas reais, não sobre impossibilidades teóricas .
Se o engano fosse impossível para os escolhidos, o tom urgente do capítulo perderia completamente o sentido.
2. O peso da expressão “se possível fora”
A frase grega hōste planēsai, ei dynaton, kai tous eklektous significa literalmente:
“a ponto de enganar, se fosse possível, até os escolhidos”.
Roger Olson destaca que essa construção não afirma impossibilidade absoluta, mas enfatiza a gravidade e intensidade do engano .
Jesus não está ensinando:
- que os escolhidos são imunes por decreto,
mas: - que o engano será tão poderoso que alcançaria até mesmo aqueles que pertencem ao povo eleito.
3. Quem são “os escolhidos” em Mateus?
No evangelho de Mateus, “os escolhidos”:
- não são indivíduos metafisicamente garantidos,
- mas o povo de Deus, os discípulos, os que pertencem a Cristo.
Laurence Vance observa que “eleição”, no Novo Testamento, é frequentemente corporativa e funcional, não uma blindagem individual contra queda ou engano .
Nada no texto sugere:
- impossibilidade ontológica de engano,
- ou perseverança automática independente da vigilância.
4. A função das advertências
Jesus não diz:
“Não vos preocupeis, os escolhidos jamais podem ser enganados”.
Pelo contrário, Ele diz repetidamente:
- “vede que ninguém vos engane” (Mt 24.4)
- “não creiais” (v.23)
- “se alguém vos disser…” (v.26)
Dave Hunt afirma que advertências só têm sentido quando existe perigo real; do contrário, tornam-se encenação pedagógica .
5. O erro da leitura calvinista
O calvinismo clássico costuma interpretar Mateus 24.24 como prova de que:
- os eleitos verdadeiros jamais podem ser enganados,
- a frase “se possível fora” indica impossibilidade absoluta.
Roger Olson chama essa leitura de conclusão sistemática, não exegética .
O texto:
- não afirma que o engano é impossível,
- não explica por que não ocorreria,
- apenas enfatiza o quão extremo ele será.
6. Harmonia com outros textos bíblicos
A interpretação de que o engano é possível harmoniza-se com todo o Novo Testamento:
- 1 Coríntios 10.12 – “quem pensa estar em pé, veja que não caia”
- Gálatas 1.6 – “estais passando para outro evangelho”
- Colossenses 2.8 – “vede que ninguém vos faça presa sua”
- 2 Pedro 2.1 – falsos mestres introduzem heresias destruidoras
Smelley observa que a Escritura nunca trata os crentes como imunes à sedução espiritual, mas como responsáveis por permanecer na verdade .
7. Por que Jesus enfatiza “até os escolhidos”?
A frase não minimiza o risco — amplifica-o.
Jesus quer dizer:
Se o engano é capaz de alcançar até os escolhidos, ninguém deve confiar em si mesmo.
Norman Geisler observa que essa linguagem serve para:
- despertar vigilância,
- evitar presunção espiritual,
- reforçar a necessidade de perseverança .
8. Então, os escolhidos podem ser enganados?
À luz do texto e do ensino bíblico geral:
✔ O engano é real
✔ A advertência é séria
✔ A vigilância é exigida
✔ A perseverança é necessária
✔ A eleição não é imunidade automática
Dave Hunt resume bem:
A Bíblia nunca promete que os crentes não possam cair, mas constantemente os exorta a não caírem .
Conclusão
Mateus 24.24 não ensina que os escolhidos são incapazes de ser enganados.
Ensina que:
- o engano será extremamente poderoso;
- alcançará níveis jamais vistos;
- e colocará até os escolhidos em risco real.
A proteção bíblica não está:
- em um decreto secreto,
- nem em uma eleição automática,
mas em:
vigiar, discernir, permanecer na verdade e perseverar até o fim.
Por isso, a advertência de Jesus continua válida para a Igreja de todos os tempos:
“Vede que ninguém vos engane.”
